segunda-feira, 27 de abril de 2009

Lugo, seis filhos, várias igrejas e um país

Rodrigo C. Vargas

Há duas semanas a vida do presidente paraguaio Fernando Lugo começou a mudar. Sua imagem de salvador da pátria se transformou na de tarado do clero. Isso por que o ex-bispo católico reconheceu como filho o menino Guillermo Armindo, de dois anos, fruto de um relacionamento com Viviana Carrillo Cañete. Até ai tudo bem, fez o papel dos justos. O problema para a maioria é que a mãe da criança engravidou enquanto Lugo ainda era bispo.

O escândalo foi potencializado com o passar dos dias. E o Fernando paraguaio foi pouco a pouco descobrindo, diríamos assim, que sua prole poderia ser bem maior.

Uma segunda mulher, Benigna Leguizamón, ex-funcionária da diocese de San Pedro (cidade a 400 km ao norte de Assunção, onde Lugo manteve o hábito religioso até 18 de dezembro de 2007 quando renunciou para se candidatar à Presidência.), apareceu exigindo que o presidente reconhecesse também o filho Lucas Fernando de seis anos.

Em seguida, uma terceira mulher, Damiana Morán, também denunciou que tem um filho com o atual presidente e ainda afirmou que o líder é pai de ao menos, seis crianças. Ela ainda contou a imprensa que começou a relação com Lugo há cinco anos e a intensificou durante a campanha eleitoral em abril de 2008.

O que deveria deixar todos perplexos não é a quantidade de filhos que surge a cada semana, nem somente o fato de Lugo ter sido bispo enquanto os fez. Mas como a igreja trata o celibato e como seus membros o tratam de volta. Várias mulheres disseram ter denunciado o ex-bispo à igreja e elas tem uma testemunha importante, o bispo de Alto Paraná e Canindeyú Rogelio Livieres.

Ainda assim, terça passada durante a Conferência Episcopal Paraguaia os religiosos asseguraram não ter recebido nada e que “Se a denúncia foi apresentada perante a Nunciatura Apostólica, seu tratamento e definição foram de exclusiva competência da [instituição] mencionada”. A Nunciatura é a representação diplomática do Vaticano, equivalente à embaixada.

Aqui no Brasil, a CNBB realizou ontem, encontro ecumênico em Indaiatuba no interior de SP. Os bispos discutiram a formação religiosa de padres no país e o celibato foi um dos assuntos. Em fevereiro do ano passado, ao final do 12º Encontro Nacional de Presbíteros, realizado na mesma cidade no Mosteiro de Itaici, o documento final propunha ao Vaticano a busca de alternativas para o celibato sacerdotal. Aprovado por 430 delegados que representavam os 18.685 padres das 269 dioceses brasileiras, onde trabalham em 9.222 paróquias, o pedido foi enviado à Sagrada Congregação para o Clero em Roma. Nada mudou e nem vai, já que esse Papa já reafirmou o celibato como ordem imprescindível.

A imposição do celibato surgiu no ano 306, no Concílio de Elvira, apenas para à Espanha. Entre 1537 e 1563 durante o Concílio de Trento se tornou obrigatório em todo o mundo. Como hoje há uma maior liberdade para discutir a igreja, alguns rumores dão conta de que o afastamento de qualquer possibilidade de sexo e do casamanto, tem ligação direta com a manutenção dos bens da igreja. A matemática é simples: Família = mais despesas e Separação = separação de bens.

O caso Lugo não é o único. Uma vasta literatura a respeito vem sendo publicada. Em 1999 o livro Gone with the wind in the Vatican escrito pelo monsenhor Luigi Marinelli, ex-chefe da Congregação das Igrejas do Leste, revelou supostos segredos inconfessáveis da cúpula eclesiástica: brigas pelo poder, homossexualismo e quebra de celibato. Na capa do livro vem escrito: "É hora de a igreja pedir perdão a Cristo pelas diversas infidelidades e traições de seus ministros, especialmente daqueles que ocupam altos cargos na hierarquia do Vaticano." Marinelli está sendo processado por difamação. O livro mostra o exemplo de dois bispos: um teria sido surpreendido pela polícia num carro, seminu e com outro homem; o outro bispo teria se apropriado de dinheiro dos fiéis para sustentar um filho por ele não reconhecido.

O que fica claro em situações como a do Paraguai é que o celibato deixou de ser integrador para ser um ato de protesto individual, privado. Distante da igreja apesar de ser cometido enquanto ela.

Ontem, o presidente falou pela primeira vez sobre os casos e não confirmou e nem negou o envolvimento com as mulheres. Fez questão de pedir perdão e de afastar qualquer possibilidade de renunciar. Sobre o perdão, parece que a população de Assunção, capital do país, não sabe exercer muito bem a prerrogativa cristã. Cartazes com legendas contra o presidente e camisetas com frases como "Lugo, o pai da mentira" começam a circular em grande número. A resposta pode vir de cima.

O escândalo coincide com novos atritos do chefe de Estado com o vice-presidente do país, Federico Franco, pela reestruturação ministerial que ordenada há poucos dias. Parte da imprensa local e analistas políticos consideram que as mudanças fazem parte de uma estratégia para desviar a atenção. A reestruturação ministerial prejudicou a ala liderada por Franco que é do PLRA, partido posicionado como centro-direita e que serve como suporte político de Lugo no Congresso.

Fernando Lugo assumiu o poder em 15 de agosto passado pondo fim a 61 anos de hegemonia política do Partido Colorado à frente de uma coalizão que apesar de ser integrada por diversos grupos sociais e de esquerda, é liderada pelo partido do vice.

Um comentário:

Pedro Ricelly disse...

Em quem confiar agora?
Nos políticos é que não.