Rodrigo C. Vargas
Ondas rolando sobre pequenas cidades, frágeis. Cotidianos desaparecidos, selvagens. A terra tremendo, o ar furioso e contaminado. Centenas de imagens nipônicas resumindo tudo a pó, repetidas na minha frente. Sentado no sofá, alguma coisa mudou. Eu senti algo parecido com o que é comumente conhecido como Déjà vu. Não era meu e eu não conseguia lembrar. Depois comecei a relacionar as imagens. Apesar de saber que a história é feita de fatos repetidos, o que eu via não saiu de nenhum livro. Toda esse drama está claramente representado num clássico do cinema mundial: Sonhos de Akira Kurosawa, produzido em 1990.
A terra preta banhada de sangue e os gritos vindos de todos os lugares me remeteram ao sonho número seis, Monte Fuji em Vermelho. Neste capitulo, Kurosawa descreve o caos íntimo, uma premonição. Nem Dali conseguiu tocar tão fundo no inconciente. O desespero daqueles milhares aos pés do Monte Fuji em erupção, respirando o ar negro expelido de uma usina nuclear em chamas. No filme o homem que se diz responsável pela falha que expôs o povo à radiação diz preferir a morte rápida de um afogamento à lenta provocada pela radiação.
Akira conduziu sua obra com ternura, mesmo nos momentos viscerais. Portanto, por mais que tudo pareça pesadelo, o sonho é a forma que encontrou de mostrar que o caos modifica o homem quase sempre para melhor. No cinema a catástrofe foi causada pelo homem, a realidade que o Japão vive hoje é natural. Resta uma pergunta: natural ou naturalizada? Não há resposta. Não adianta tentar.
Os filhos do sol nascente não desejam a eterna repetição do recomeço. É assim desde Hiroshima e Nagasaki. É assim desde o princípio. A angustia desse povo estruturado é saber que o que vem de fora muitas vezes é mais forte do que o que vem de dentro. Essa é a verdadeira ordem natural das coisas. Espero que um dia mude.
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